Agora vai ser cada dia mais comum matérias com imagens assim: Sem preso (Foto: PousoAlegrenet)

* Antes de tudo, uma ressalva. O intuito desse artigo não é entrar no mérito se a Lei de abuso de autoridade é ruim ou boa, muito menos criticar autoridades, e sim mostrar os impactos dela no jornalismo.

Quase dois meses depois do início do vigor da Lei de abuso de autoridade, assim como no Brasil, a imprensa de Pouso Alegre e a sociedade local, já sentiram as mudanças que a nova lei causaram no noticiário. Ficou muito mais difícil ter notícias com nome ou imagem de presos ou envolvidos em ocorrências policias.

Para a imprensa, conseguir essas informações já não era fácil. Aqui em Pouso Alegre, raras as vezes que as autoridades divulgavam ou davam informações como nome e foto. Quando o repórter a solicitava, a identidade muitas vezes era negada. O comum, era a imprensa ficar sabendo por terceiros, e daí conseguir uma confirmação ‘em OFF’ com alguma autoridade. Mas agora nem isso.

Se antes, algumas dessas situações da lei de abuso de autoridade poderiam levar a infrações político-administrativas, agora o risco é a autoridade pegar 4 anos de cadeia, uma pena maior do que a de muito criminoso perigoso. Isso tem preocupado os policiais. Mesmo a imprensa tendo o direito a manter o sigilo da fonte inclusive na justiça, e tendo sua liberdade garantida pela constituição, a nova lei impôs medo as autoridades.

Com base em três artigos da Lei do Abuso de Autoridade, aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente da República, instituições policiais de todo o país estão suspendendo a divulgação dos nomes e das imagens de presos em ações de rotina ou operações. Temendo punições, as corporações orientam seus agentes a também não repassar informações à imprensa — a medida foi adotada em pelo menos 11 estados.

Em janeiro deste ano por exemplo, o PousoAlegrenet recebeu pelo whatsapp fotos que seriam de dois homens presos acusados de matar uma idosa na zona rural. Só que nenhum policial procurado quis confirmar a imagem. Sem ter como checar a informação no momento, as fotos não foram publicadas.

No final do mesmo mês, a Polícia Civil fez uma grande operação cumprindo dezenas de mandados de prisão contra uma quadrilha que realizava roubos na zona rural. O principal alvo das quadrilhas eram idosos, que eram agredidos. Mas novamente, não foram divulgados nomes e nem fotos dos presos. A imprensa coube uma entrevista com o delegado dentro de uma sala, e fotos do que foi apreendido.

O medo de uma punição é tanta, que a polícia tem feito até esquemas para evitar que a imprensa consiga fazer imagens. Na última sexta-feira (14), quando a Operação ‘Capina’ prendeu o ex-secretário de finanças da gestão Perugini, Messias Morais, a imprensa esperou horas com as câmeras prontas na porta da delegacia. A viatura da PM então parou uma esquina antes, e o preso foi trocado para dentro do carro do advogado, com vidros escuros, e entrou pelos fundos.

Para não ser filmado, antes de chegar a delegacia, Messias saiu da viatura da PM e entrou no carro de seu advogado, que tinha vidros escuros, e o deixou na porta dos fundos da delegacia (Foto: PousoAlegrenet)

E não ficou só na imagem do ex-secretário, que vale ressaltar, é uma pessoa pública e conhecida. Mesmo havendo elementos que possibilitaram um mandado judicial para a prisão preventiva, o Ministério Público não deu nenhuma informação do caso, por ainda não ter apresentado a denúncia a justiça.

Mas em 11 de dezembro, 20 dias antes da lei de abuso de autoridade passar a valer, a mesma Operação Capina deu uma coletiva de imprensa passando informações sobre a prisão dos dois empresários investigados no suposto esquema de desvios milionários. Um deles inclusive ainda não tinha sido preso, apesar do mandado de prisão.

Vale ressaltar novamente. Esse artigo não é uma crítica as policias, ao Ministério Público, ou outras autoridades judiciais. Eles estão praticamente de mãos atadas por uma lei criada pelos políticos, e que beneficia principalmente os poderosos, grandes criminosos, assassinos e estupradores, pois esses sim tem atenção da imprensa e da sociedade. Diversos trechos da lei são questionados no Supremo Tribunal Federal (STF) por entidades que representam juízes e procuradores.

Se continuar assim, a população vai perder interesse em matéria policial, e consequentemente a imprensa também. E com o passar do tempo, haverá um esvaziamento da percepção da população quanto ao trabalho da polícia.

Atualmente, o PousoAlegrenet é disparado o veículo de imprensa de Pouso Alegre que mais expõe fotos e nomes de indivíduos presos. Mas agora, se ao ver o noticiário policial, você achar ruim de não ter todas as informações – as vezes nem informações -, lembre-se de que a culpa não é nossa. E mais do que nunca, a imprensa precisará que você, cidadão comum, enviem informações, para que a imprensa tente checá-la.